18.4.05

Bom-dia

Sentou na cadeira mais próxima à porta caso quisesse fugir entre uma explicação ou outra. O caderno era de papel reciclado, donde uma grande foto se exibia à capa. Homem velho, na secura dos seus tantos anos, um não-sei-que nos olhos de um sertão profundo.

Olhou tudo com estranheza e hesitação muitas. E falava tanto consigo mesmo que não suportava os barulhos próprios, inda mais quando estes faziam se misturar, insuportáveis e inapreensíveis, com os barulhos outros; os de fora.

Pensou em dizer algo à menina que trazia ao lado, mas percebeu que esta traçava alguns riscos descontínuos e sonolentos no caderno enquanto anulava a vista com o nada, o que logo o fez concluir que deveria estar ocupada demais ignorando a sua existência. Quietou-se então.

O ventilador fazia uma dança engraçada com as folhas que encimavam as mesas. Deu atenção bastante e pôs-se a rir sozinho, logo olhando em volta para garantir que não o vissem atendendo a asneiras das que gostava. Riu enquanto o riso lhe era sincero e secreto.

Os traços da menina começavam a ganhar sentido, sabe-se não se próprio ou se emprestado dos olhos do menino. Viu uma velha de crânio bem achatado, donde os cabelos faziam moldar um caracol imenso que se findava no estreito da folha, que se dispersava na desconexão dos traços que seguiam, e logo se juntavam num monte, num lago, num gordo, num trapo e numa velha, mais uma vez seus cabelos...

O professor acordara achando a vida uma merda e disse:

- Bom dia!

A classe que bem o achara, desde o princípio, uma merda de professor, caridosa fez repetir:

- Bom dia!

E o dia, como que da mágica das palavras insinceras, fez-se em merda semelhante.

A aula encerrou quando da morte de uma hora e meia.
...
Deu dois reais pelas mãos do mundo, embora houvesse sido o malabarismo uma merda das que dão tristeza, como fazia ser o dia. Logo após já não sabe bem por que dá dinheiro assim mesmo, todo dia.

Se tanto diz, com a boca cheia de verdades, que o Bill Gates quer o mundo endinheirado o suficiente pra poder comprar mais computadores, que rodarão o Windows e infinitos softwares que ele inventa entre uma mijada e outra. E que o Silvio, por outro lado, quer o povo bem pobre. Com alguns sortudos levando um tanto de dinheiro, é mesmo, mas o resto, bem o sabe, só na medida de se continuar sonhando com uma vida melhor, vida em uma das casas que sorteia...Seus risos que disfarçam entrerisos que desfazem seus risos que nebulam outros mais...

Mesmo assim o dá. Porque lembra que, morta mais meia hora, vai estar enchendo o bucho de carne, arroz, feijão e batata... E já não lhe importa se o dinheiro vá mesmo se converter em comida, só pensa que queria que todos comecem do seu prato. E escrevendo, e dando dois reais sem pensar em todas as causas, ou razões, ou covardias que o reduzem, e reduzem suas ações, é como se saciasse a fome do mundo.

Mas aí sobra pensar. Será que ele quer que continuem pobres, porque paga por malabarismos que não fazem senão ver como tratamos mal as nossas crianças? Será, que ao pagar a injustiça da não-educação com dinheiro, não estamos de enlaço com as mãos dos milionários?

Talvez.

algumas linhas descontínuas.
Secura, um sertão profundo.
Uma velha
Um caracol
Uma dança
Uma moça
Uma fome
[Mãe de todas as fomes]
uma tal poesia íntima.
Saciando em mim, a fome de alimentá-los.

9.4.05

quando nasci senti sua falta

Então vamos dar uma volta. E as ruas vão decaindo por outras que mal sabemos. E das que não sabemos, se sabe aonde queremos chegar...e chegamos...e a boca...e o medo...E a chuva faz cair cá logo, de onde se faz ver córregos, por entre o decaimento de ruas...mas não tão logo...não...

há por dantes o colo, em que fiz-te acalentada...e fez-me, por sim, tão não mais meu...e a chuva cá logo..."inda não...ainda não" ...a boca...o córrego...

...esquece...esquece o córrego...

(silêncio)

-Agora ou daqui 20 anos?

O colo...descolo....senta, olha, os olhos...

- Quero não...gostei pouco...pode refazer?

- Pode!

- Agora e daqui 20 anos...

...Agora sim, chuva cá logo, a chuva...

O córrego...nas ruas e nas bocas? A boca, por donde decaem ruas, e esquinas, e laços e enlaces...e decaem donde? Sei não...a boca...o beijo...o córrego
A chuva chuvendo...

-Vamos ser loucos?
-Mas o bar, mas a roupa...
- Ora...

A boca, o pé...o pulo, a chuva, o banho, o amor...a rua, sem rua...só boca, e o córrego descendo o lábio que procura, cego, o outro, e - eu queria que fosse assim, bem como foi, bom- tudo estragado feito seria...sim...se não o fosse bom como fora...

Mas foi, e então...molhados...mas a festa? Pra quê? Se somos dois, que não sabemos se agora ou se daqui vinte...

-Vem?
-Vou!

Disca, toca, atende...oi...não...vai não...vai ficar comigo, sim...sei...eu digo... Disse pouco, meio brava parece...
Importa agora?

Se eu gosto de escrever córregos e bocas 20 vezes no mesmo texto? Se eu gosto de beber cerveja no Fissura? Se eu gosto do violão dos outros? E não ligo que não seja. E que não soe como eu queria que soasse. "O Arruda, eu lembro, bem sabe tocar violão que nem eu queria que soasse o meu: não soa".
Importa agora?
Se eu gosto de você?

Vamos dar uma volta, sem rumo de ruas, decaem no "nós" os caminhos muitos, que se seguem, e saber que chegamos... estamos vendo luz bonita ao longe, bem do alto da cobertura, cheia de plantas e de nada escuro que a noite dá, e damos a ela nós...sem córregos...mas bocas, denovo...elas...untas.

Imploridão silenciosa, faço, estalo bom dos lábios...cobertura

-Vento, aqui de cima...frio faz
- Sinto que não, que há quente por hoje

E faço um sorriso longo com meus dentes todos...porque tampouco sinto frio aqui, e amo quando você diz, o que ninguém diz, assim, e sai andando pro sempre de te ver andar.

E eu bato o carro...e digo, droga. Minha vida, nesse para-choque-sem-tinta-cara-de-coluna-da-garagem. E resmungo, e quero chorar com os dois olhos, e então, esqueço, mas sou criança porque ligo pro meu pai e...

-Droga pai, salve um menino que faz besteira no sempre...
- Meu filho...você não mais cabe nos meus ombros...
E eu calo.

E menina, pai mais não...sua casa? Sim, motor francês, menina no banco do lado.
Sabe bem, aquela rua, bem logo ali Cerro...quer virar por aqui, ou não...

De pronto chegamos, e a mãe de namorado e pijamas dá oi e beijo, e adentra, com o namorado que veio também. Tem foto da filha do ex-padrasto bem pregada na parede.

-Sei nem pra quê!
Penso das fotos que também não querem sair do meu quarto. Mas não digo.
Tiro tênis, chave, carteira: os recosto.
Recosto-me. Recosto-a. Recostamos.
A luz do aquário é assim pouca, a deixa. Mas logo a apaga, pra gastar energia com o ventilador de teto, que ventilou, bem sabendo que pra isso serve. Adoro ventiladores, tanto mais os de teto. Por isso sou redundante. Ventilou. Tão bom. Ventilador. Bem teto. Barulho de girando.

E falo, e faço ser. E gosto de quando ela sorri, e sai andando, assim, pro sempre de ver teus olhos. Por isso digo. E ela é a criança que eu bem fui no estacionamento. Boca, medo, córrego...

- Não sei portar, sei não agir...
-Mas sabe ser?
- Acho que não...

E escorrem dos olhos dois córregos, e lembro da chuva, e do portão... colo...descolo...as duas bocas unidas.

-Mas que difícil essa coisa de ser!

Eu te mostro, com o meu silêncio. E não faria sentido, se não fosse com ela. Mas faz. Toda a minha falta de sentido encerra todo o sentido do mundo quando ela faz que vai ser e não faz. E estamos bem logo fazendo aquilo que mal pensávamos... só pra dizer que o fizemos...

-Eu nasci denovo...rindo!

E então descansa o meu abraço. Até se ir a noite que nos entendera amantes.
E digo da manhã, do tempo de ir...
Ela faz cara bonita de soninho gostoso, que dá vontade de ficar...

E eu gosto quando ela sai andando pra’quele sempre se ir...

O elevador me leva...
O carro me leva...
As ruas me levam...

Os córregos secaram

Na cama o corpo descansa...
a alma, esta não, que aí deixei...

FICOU

1.4.05

Renato e Eu

(Ren)- ow, c viu q o papa morreu
(EU)- morreu?

- a imprensa diz, e o vaticano nao confirma
- eu vi hoje na net q ele tava mal

- mas eu acho q morreu
- deve ter morrido, a igreja ta adiando o choque

- será q vai ter aula a noite, se ele morrer?
- hahaha

- q merda d pergunta neh. o cara ta morrendo
hehehehe
- pq não teria? tudo para?

- eh... q nem semana santa
- a PUC eu entenderia

- o importante eh q eu num to afim de ir a aula hoje
nem um pouco!
- problema seu...
quem mandou ser mais inteligente do q aguenta?