Com a arma já assentada sobre as duas mãos, ostentou no olhar uma certeza sem precedentes, confiante de que quando precisasse, saberia usá-la. Dessa vez, no entanto, a violência das novas ideias causaram-lhe uma vertigem que o obrigou a se apoiar no balcão.
- Tá tudo bem com você? - indagou o lojista, preocupado mais com o trabalho que teria caso o sujeito desmaiasse na sua frente.
- Sim - mentiu sem perceber, como se ludibriando as próprias ideias pudesse atenuar seus efeitos colaterais.
Havendo intuído o poder de seu exercício mental, fabricou um antídoto, uma frase infantil que o irritou profundamente em um primeiro momento: todo mundo tem que poder aprender. Mesmo inconformado com a própria imbecilidade, agarrou-se à ideia como que a um tronco no meio daquela correnteza. Era tão estúpida quanto útil: pinçada entre tantas outras que ainda o permeavam, bastou para que ao menos recuperasse o fôlego necessário para se soltar do balcão. Com uma pressa incompatível com seu estado até então, colocou a arma e a munição na maleta de trabalho e saiu em disparada.
Já na rua sentiu o ar úmido de verão e previu que suaria um bocado no caminho de volta.